terça-feira, 11 de agosto de 2009

Cibercultura, a perigosa

O ano 2000 chegou, eu vi, e decidi tomar o partido da humanidade
Pierre Lévy

INTRODUÇÃO

Mais cedo ou mais tarde algum dos ditos "fenômenos sociais", emergiria do pântano das criações humanas, "encapsulado" em alguma roupagem ilusória, ocultando em suas entranhas verdades que, quando descobertas ou levariam seus criadores a repensar a criatura ou fariam desses meros vassalos, levando todos a um desditoso fim ou ao início da recriação - porque a criação já foi.


Esse fenômeno mitológico é a tal da cibercultura!

Mas o que ela é exatamente? Quando foi que a utilização de um "utensílio doméstico", uma "ferramenta de apoio", um "aparelho facilitador" ganhou o direito de chamar-se "cultura"? – Isso não significa que possa haver confusão sobre a diferença entre veículo e conteúdo, mas é inegável que a internet, indubitavelmente, é o ícone da cibercultura. Portanto são válidas essas perguntas.

Antes de pensar se existe resposta para a segunda pergunta, ou mesmo se isso chega a merecer ser chamado de pergunta, olhemos por sobre nossos ombros para a História e vamos nos perguntar quando foi que tivemos outras culturas baseadas em um ícone?

Tivemos a cultura do ábaco? Do lápis? Da imprensa? Da TV?... Essa última, não há como discordar, é mais muito mais do que uma cultura, está mais para um conquistador insaciável e incansável que envolve e molda "sua própria imagem e semelhança" em tudo que a humanidade produziu, e que mereceu ser notícia, desde 1924.

Aliás, usando a cultura da TV, existe uma comparação bastante simples que mostra um pouquinho do que podemos esperar - na verdade já é possível ver - dessa dita cibercultura. Na cultura televisiva - que de agora em diante andará emparelhada com a cibercultura até ser totalmente engolida por ela - existe a necessidade social de limites e esses limites se traduzem nas "cartas de intenções" de muitos órgãos de vigilância, ou mesmo censura, em vários países, além de entidades particulares que tentam ditar alguns horários de programação, principalmente nos USA.

Certo é que alguma forma de controle de horários de determinado tipo de programação existe em todos os países. É claro que a palavra "censura" deve ser vista com a desmedida singeleza que adquire nesses casos em que falamos de países democráticos, mas uma auto-regulamentação existe sim.

Já do outro lado, no universo da cibercultura, isso é impossível e é assim mesmo que tem que ser, afinal pensar em algum tipo de cerceamento no ambiente do ciberespaço é uma ignomínia, há que se concordar.

Mas não sejamos tão ingênuos a ponto de não percebermos o nível de censura que já existe na internet – haja vista o “bloqueio” a determinados países que ocorre quando você tenta um acesso a um determinado conteúdo? - Não se trata de salvaguardar "segredos industriais", trata-se de conteúdos proibidos para uma determinada gama de endereços IPs, que caracterizam esse ou aquele determinado país.

O chamamento às matérias com este conteúdo - cibercultura - geralmente faz loas à dita, mas apesar de tudo que podemos encontrar de positivo no universo da cibercultura, esses avanços tecnológicos quase sempre apresentam outro lado menos positivo para o indivíduo ou são dignos de uma análise mais profunda e criteriosa sob a ótica da interferência dessas tecnologias na vida do mesmo. Não é possível ficarmos atrelados a todas essas meias-verdades como se fossem a panacéia universal.

A cibercultura é uma expressão perigosa até mesmo em sua definição que, como tal, precisa ser muitíssimo bem entendida. E, além disso, seus aproveitadores freados em suas intenções igualmente daninhas.

Vejam que já chegamos ao cume, já tivemos um presidente eleito com a força da cultura da internet e não foi qualquer presidente, foi o presidente do país ainda tido como o mais poderoso do planeta. Essa verdade é fácil de se verificar haja vista que o primeiro discurso de agradecimento como presidente eleito feito por Barack Obama foi na Internet!

O próprio termo Cibercultura tem vários sentidos. Mas se pode entender por Cibercultura a forma sociocultural que advém de uma relação de trocas entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias de base microeletrónicas surgidas na década de 70, graças à convergência das telecomunicações com a informática. A cibercultura é um termo utilizado na definição dos agenciamentos sociais das comunidades no espaço eletrônico virtual. Estas comunidades estão ampliando e popularizando a utilização da Internet e outras tecnologias de comunicação, possibilitando assim maior aproximação entre as pessoas de todo o mundo. (Wikipédia)

Essa parte da definição de cibercultura, que pode ser lida na Wikipédia, oculta um procedimento estratégico de dominação que não pode simplesmente ser relevado como uma sandice ou paranóia. Quando lemos “... maior aproximação entre as pessoas de todo o mundo..." também estamos lendo "todos os peixes em um só barril" e esse "barril" fica mais apertado na medida em que, através da Internet, falamos uma mesma língua - como se fosse um Esperanto sem esperanças -, ou passamos nossas impressões e aceitamos impressões de terceiros mais facilmente ou mais inadvertidamente.

Lá também está escrito: “... ampliando e popularizando a utilização da Internet..." - essa frase pode ser bastante interessante porque a partir dela vislumbramos os peixes no barril. Como exemplo, citamos o último mês de Maio, logo no início, quando presenciamos um "caos sutil" em um grupo - grande - desses peixes, na ocasião em que a GOOGLE esteve "quase fora do ar" em virtude, segundo a empresa divulgou, de falhas em um grupo de roteadores. Houve muitos relatos de pessoas que se sentiram desnorteadas por não poderem usar aqueles serviços. - Desnorteadas? Por não poderem usar um determinado serviço da internet? É um serviço essencial? Isso é um vício?

Antes de citarmos outro exemplo, não nos esqueçamos que a atual tecnologia “traz para suas mãos a Internet”, como apregoam os inúmeros comerciais falando sobre essa “facilidade”. Isso posto e voltando aos peixes encerrados em um barril podemos citar, olhando apenas para nosso País, que tínhamos em Março de 2009, uma proporção pouco acima de 80% de brasileiros com aparelhos celulares conforme registros da própria Anatel. Quer saber onde estão os peixes? É só constatar que há 12 anos atrás os celulares não eram comuns e vivíamos muitíssimo bem sem eles.

E agora se imagine, nos dias de hoje, saindo de casa sem ele!

Existe uma malignidade na cibercultura, vejamos as razões: esse "demônio" que foi insinuado não tem chifres, ele age de forma venenosa e bastante dissimulada quando o assunto é "pensar em corações e mentes", principalmente corações e mentes jovens e de países menos desenvolvidos – vejam os IPs mencionados anteriormente - e isso se torna claro quando olhamos para a média dos jovens brasileiros e percebemos uma “mesmice virtual”. É difícil vermos conversas que ultrapassem as ferramentas padrões, como se não houvesse novos instrumentos aparecendo quase diariamente – e nem assuntos mais profundos – como se os assuntos que envolvessem a internet não fossem além das fofocas do grupo.

Não há como discordar de que o jovem brasileiro - ou o latino-americano - de hoje em dia, final da primeira década do século XXI, esteja buscando seu espaço na comunidade, mas será que um percentual alto desses jovens sabe bem o que está procurando? Será que ele, o jovem mediano, sabe aproveitar positivamente as facilidades dessa cibercultura para seguir o seu caminho? Ou essas mesmas “facilidades”, na medida em que são despejadas em seu colo, simplesmente, não o está tornando mais e mais dependente de algo, qualquer coisa que seja, que simplifique demais as ações que poderiam fazê-lo mais cônscio de seus deveres ou até de si mesmo? Afinal a própria leitura está sendo posta de lado quando falamos de pesquisas escolares, ou ainda pior, trabalhos de final de curso em universidades. Em listas de discussão com algum conteúdo técnico não é sequer raro vermos pedidos de material para composição de trabalhos de fim de curso e outros. E, muitas vezes, esses pedidos são atendidos on-line.

Onde foi parar a pesquisa própria, a busca de informações ou o simples folhear de livros?

É claro que facilidades são bem-vindas, desde que elas não destruam o processo de assimilação e aprendizagem, muito menos a prazerosa curiosidade humana ao mesmo tempo em que “quebram paradigmas” como alguns querem crer ou repetem esta expressão, cegamente, sem perceber a óbvia “ode à preguiça” que estrondeia por trás do termo.


Mas o alvo não são somente esses jovens. Há pouco tempo, “maduros” também se deixaram levar por um viral que provocou ondas de sentimentalismos, indignações, apoios exaltados e por aí vai, quando o fato nada mais foi – e isso era mais do que evidente - do que uma armação da TV inglesa sobre um programa do tipo “show de calouros” que, aliás, já foi desmascarada. A forma como esses “virais” afetam a comunidade merece uma atenção mais séria haja vista serem capazes de provocar comoções que podem agir sobre diferentes áreas da sociedade, até mesmo gerar sérios problemas comerciais e econômicos. A propósito, “viral” deriva da expressão “marketing viral”, coisa já antiga nos meios de comunicação. Fala-se “viral” para notícias, imagens ou vídeos que se espalham pela internet como se fossem um vírus de computador, sem o efeito destrutivo do mesmo, ou quase.


Quando o assunto passou por censura na Internet, a imagem foi de leitores se questionando: "Se existe censura, então pode existir manipulação?" - daí se existe manipulação... Deixemos a cada um a tarefa de “desfiar um rosário” sobre isso!

Outro prisma mais triste e opaco da cibercultura pode-se perceber quando, extrapolando o ícone dessa cultura – a Internet – lemos essa parte da definição: "... novas tecnologias de base micro-eletrônicas..." e nem falando do complemento da frase, "década de 70", mas vindo para os dias atuais, muitas dessas novas tecnologias que aproximam as pessoas, também mantém cada qual em sua ilha, distantes do contato físico ou daquele bom e velho olho no olho.

É comum entrarmos no metrô ou no ônibus e vermos as pessoas mergulhadas em si mesmas, ouvindo alguma coisa, jogando alguma coisa ou falando com alguém através desses aparelhinhos que - além de servirem como distração - garantem que você sempre seja encontrado esteja onde estiver, até em um buraco debaixo da terra - e o outro ser humano ali do lado, que bem poderia render uma boa conversa, uma interação amiga ou uma boa amizade, tentando fingir-se de distraído.

Mas sem deixar fugir aquele ícone mencionado- e sem conseguir evitar visto seu poder - existe um exemplo bastante difícil de encararmos: a Internet alimenta uma condição comum nas pessoas e que, devido a ela, deixa de ser um problema isolado de cada um, para tornar-se o motivador de mais uma moda da cibercultura, essa necessidade que temos de que nos vejam mais como desejamos ser do que como realmente somos o que, convenientemente, também nos afasta do convívio real – a dicotomia entre o ser real e o ser ideal. Essa distância imposta pela moda dos chats afasta-nos uns dos outros, nos permitindo, tolamente, nos apresentarmos como bem quisermos em detrimento da verdade de quem somos. Quem tem filhos já deve ter passado pela experiência de ver o rebento chegar em casa da escola e ir para alguma sala de bate-papo para "ficar conversando" com os colegas do colégio. Mas eles estavam juntos agora mesmo!!! Que diabos?!

Alguns poderão defender-se com o justo escapismo da segurança, das dificuldades dos pais em ficar até tarde no shopping ou na própria escola enquanto os filhos "trocam figurinhas" (nem sempre tão literalmente), ou que as crianças não querem ficar "pagando o mico" de ter algum dos progenitores por perto. Certo, pode até mesmo ser compreensível, mas quando uma conversa "cai na rede", essa conversa também pode ser monitorada não é mesmo? Mas por quem?



RESUMINDO

A conclusão de Comasseto, ao comentar Pierre Lévy:


A expansão da consciência e a inteligência coletiva que, pelo advento da rede eletrônica que conecta o mundo de modo virtual e instantâneo, estaria prestes a democratizar o acesso às formas de poder e a realizar o ideal tão sonhado de uma sociedade autônoma e igualitária.
(Comasseto, 2005)

À luz das realidades que nos sufocam chega a ser inocente e sonhadora. É até bonito pensar assim, sonhar com algo assim, almejar e buscar essa realidade, mas a dura e crua realidade mesmo é outra e não tem nada de "sociedade autônoma e igualitária", é um jogo de dominação sem precedentes e com gente apoiando sem ter a menor noção do que está realmente acontecendo ou, sem nenhuma preocupação com o futuro dos seus.

Martin Heidegger, um “pensador da técnica”, condena as correntes que a vêem como: a) uma atividade do homem; b) um meio para determinado fim - e muitos fazem coro com ele, eu até quero fazê-lo também, mas no “frigir dos ovos”, quando paramos séria e friamente para acompanhar os acontecimentos que nos cercam, a letra "b" é exatamente o que está acontecendo, de forma daninha e inexorável, em um nível mais delicado de percepção.
Essa conclusão está bem expressada por Neil Postman:

Em que extensão a tecnologia do computador tem sido uma vantagem para as massas? Para os operários siderúrgicos, proprietários de quitandas, professores, mecânicos de carro, músicos, pedreiros, dentistas e a maioria das pessoas cujas vidas o computador está invadindo agora? Seus assuntos particulares foram tornados mais acessíveis para instituições poderosas. Eles são seguidos e controlados com mais facilidade; são submetidos a mais exames; são mistificados cada vez mais pelas decisões tomadas sobre eles; muitas vezes são reduzidos a meros objetos numéricos. São inundados por correspondência inútil. São alvos fáceis de agências de publicidade e de organizações políticas. As escolas ensinam seus filhos a operar sistemas computadorizados, em vez de ensinar coisas mais valiosas para crianças. Resumindo, para os perdedores não acontece quase nada do que precisam.
(Postman, 1992, p. 20)

É importantíssimo frisar que essa visão já era bastante clara há um bom tempo atrás, nos idos de 1992!


Então quando foi colocada, no início do texto, a frase de Pierre Lévy, a menção realmente tem o intuito de tomar partido da humanidade, a humanidade livre e plenamente democrática.


Mas onde ela está?


E para onde está caminhando?

terça-feira, 7 de julho de 2009

A Fábula do Parquinho


Sabe aqueles dias gostosos?...

Tardes de Outono! A temperatura tem todo o jeitão que vai cair você pensa em um agasalho, mas, no final, sabe que a noite será uma delícia.


Pois é! Era um dia assim, uma tarde assim. Um daqueles dias onde não há como estragar, ou não deveria haver.


Joãozinho estava todo prosa, e tinha todo o motivo de estar, sua bola nova, linda, vermelha, brilhante, nem tão leve nem tão pesada, apenas gostosa de se brincar. E lá foi ele, todo feliz para o parquinho pelas mãos de Lucelene, a babá... Não! Babá não! Lucelene era um anjo que cuidava dele quase com o afeto da mãe que tão desvelada em carinhos e cuidados quando as tarefas do lar e o trabalho na loja o permitiam, deixava-o aos cuidados daquela jovem mais que amiga, quando essas mesmas tarefas a tomavam.


O pequeno João chegou no parquinho com o coração aos pulos, todos os amiguinhos estavam ali, todos que ele chamara para sua festa no Sábado que se aproximava, estavam entre os escorregas, os balanços, os cavalinhos de latão, as trilhas de areia e os pneus pintados. E João sabia que todos iriam ver sua bola nova, que todos iriam brincar com ele e sua bola nova... A festa de Sábado estava chegando!


E assim foi! A meninada brincava com todo o fôlego dos homens e mulheres do futuro, com toda a inocência e santidade dos pequeninos que da vida, só sabem sorrir. Corrida, pique-pega, balanço, escorrega, pique-esconde, lanchinho e... Futebol!


Futebol! O pequeno João não era exatamente um craque, mas gostava do jogo, não gostava de competir, nem do natural enfrentamento entre os meninos na hora de dividir uma bola ou correr para chutar em gol, mas ele estava tranquilo, a festa de Sábado era aguardada por todos, todos queriam ir à festa onde o palhaço "Pebolim" iria apresentar seus truques de mágica e suas brincadeiras... E a festa era do João, o João que estava ali entre eles, brincando, chutando, correndo.


Em uma dessas idas e vindas do velho "esporte bretão", João e Juquinha esbarraram e foram ao chão, arrastando-se na areia do parquinho, ralando joelhos, sujando shorts, coisa de criança que Juquinha, menino levado que morava na casa do final da rua, nem ligou, levantou e já deu um chute na bola, direto para o gol, e quase que marcou o danado, levando os dois times à gritaria e algazarra natural nessa idade de sonhos e brinquedos. Enquanto todos corriam atrás da bola, Joãozinho levantou-se espanando a areia e gritou com Juquinha, disse que ele não podia ter esbarrado nele, que fora de propósito, que doera e tinha sido falta, o quase gol não valera.


Todo mundo ficou meio sem ação, ninguém vira nada, ninguém percebera nada. Juquinha - como já disse um garoto levado - nem ligou, olhou para o João e riu, riu da cara dele, riu das roupas sujas, riu do joelho ralado, riu como toda criança deve, sempre, poder rir. E todos riram também, todos, crianças que eram - meninada sadia -, riam daquilo que, para todos, era mais uma brincadeira do aniversariante do Sábado.

Só Joãozinho não ria mais, só Joãozinho não queria mais brincar, só Joãozinho levantava a mão e desferia um soco em Juquinha que, malandro que era, desviava e, ainda rindo, empurrava o agressor dizendo bobagens de criança.


João caiu e ficou esperando os amiguinhos o ajudarem a levantar, caiu e ficou esperando os convidados da festa de Sábado ralharem com Juquinha, dizerem coisas para o menino malandro da casa do final da rua, caiu e ficou esperando que lhe entregassem a bola... Mas as crianças são crianças e quando uma ri gostoso, todas riem gostosamente, pois é assim que criança é. Criança é criança!


No meio da algazarra, João, o ranzinza, tomou a bola das mãos de quem estava com ela fosse lá quem fosse, pegou a bola, botou debaixo do braço, fechou a cara e foi, choramingando, ter no colo de Lucelene, lacrimejando uma coisa que criança que é criança não sabe o que é. João sentia raiva. Raiva do Juquinha, raiva do parquinho, raiva da bola, até de Lucelene que lhe pedia voltasse a brincar. Juquinha chamou João que fez ouvidos moucos, Juquinha chamou novamente e de novo e mais uma vez, mas João, o ranzinza, não queria conversa com Juquinha, não queria conversa com os times, não queria conversa com ninguém no parquinho. João gritou com Lucelene, que se espantou com o seu Joãozinho, sempre tão calminho, sempre tão amigo e, ali naquela hora, uma pequenina e patética ferinha.


João que estava com a bola debaixo do braço, gritou novamente, gritou que não iria mais brincar, gritou que não iria mais emprestar a bola, gritou que Juquinha era um lixo, gritou que ele não podia ir à sua festa e que todos não iriam mais a sua festa e que Lucelene não iria mais a festa, que o bolo, os balões, os doces, o palhaço Pebolim eram só dele e que todos, todos, todos que não se renderam a sua autoridade de dono da bola e dono da festa, não estavam mais convidados, não poderiam mais aparecer lá no prédio dele, que ele iria falar com seu pai, o síndico, que ninguém do parquinho poderia ir à festa, ninguém, ninguém, ninguém...


No Sábado, João estava calado, sozinho, olhando o palhaço Pebolim fazer suas mágicas, afinal o artista já fora pago para isso. O pai, indignado com os agressores do parquinho que tinham surrado seu filhinho, dera ordens aos porteiros: "ninguém daquele parque entra aqui, ninguém!" e ninguém entrou, mas não porque os porteiros fossem azedos ou de coração duro, ninguém entrou porque ninguém foi à festa. Ninguém quis ir à festa.


No Sábado, enquanto no playground do prédio uma festa silenciosa acontecia, a algazarra no parquinho avisava a toda a rua: "Tem criança feliz no parquinho!"



Até a próxima!


José Vasconcellos

segunda-feira, 8 de junho de 2009

AS PALAVRAS, VOCÊ E OS OUTROS

Ah! As palavras!

Quando são ditas, não podem voltar atrás e, muitas vezes, ferem irremediavelmente. Como a flecha que busca o coração da vítima de forma infalível, também as palavras, inevitavelmente, matam. Matam uma relação, matam uma amizade, destroem um amor ou sepultam uma carreira.

De outra forma, quando escritas, as palavras têm uma complexidade inevitável. Elas não possuem emoção, não trazem entonações nem tão pouco, expressividade. Estão apenas lá pintadas em um papiro, rabiscadas em um papel, ou digitadas em alguma tela, nesse último caso, expressas com a urgência do mundo de hoje. Uma premência tão absurda que muitos de nós já não podem mais perceber. Uma ansiedade inescrupulosa que nos arremessa ao engano ou, quando menos, uma interpretação equivocada.

As palavras precisam de tempo para ser digeridas e, virtualmente, precisam sempre ser retrucadas com perguntas, caso contrário é uma temeridade acreditarmos que sabemos a que ponto conseguiremos chegar, se estivermos em uma discussão.

As palavras! Autores recolhem-se ao texto bastante bem definido, sem chances de equívocos ou que deixem interpretações, todas, agradáveis. Poetas, estes, evocam a emoção trazendo imagens que não permitam que as palavras – sempre esfíngicas - sejam somente lidas, às vezes, sequer vistas. Políticos as usam da forma mais pérfida que se possa alcançar, sempre.

Você leu até aqui esse monte de palavras e, em algum momento ou o tempo todo, achou que eu estava me dando o direito de ser “poético”.
Ledo engano! Pode até parecer que existe poesia nas palavras acima, mas antes disso existe uma lição:

“A comunicação em um ambiente corporativo,
necessariamente, deve ser clara, objetiva e translúcida.”

Se você não sabe, vai saber, de histórias sobre comunicações mal feitas, diálogos mal ajambrados que finalizaram negócios de forma trágica, corporativamente falando, ou não.
Uma pesquisa encomendada por uma consultoria inglesa mostrou que 80% dos gestores seniores de mais de 300 empresas da Inglaterra acreditam que sua organização não será capaz de cumprir os objetivos estratégicos, e metade desses entrevistados afirma que o CEO fez promessas aos acionistas que não podem ser cumpridas. E sabe o que é visto como o possível motivo para isso?
Acertou! Falha de comunicação!

Por que essa conclusão? Bem! Essa pesquisa também mostrou que cerca de um terço dos gestores – que, na maioria das vezes são os responsáveis pelo bom andamento das divisões - afirma não compreender a estratégia corporativa bem o suficiente para implementá-la. Daí as perguntas:

Se não entendeu, por que não procurou elucidar as dúvidas?

Não entendeu por quê? O que faltou? Até que ponto estava claro a apresentação das metas ou – lembrando da premência de nossos tempos – houve tempo para interrogações? Houve espaço para elas? Ou alguém (bem lá no alto da pirâmide) assumiu como correta a exposição das metas e todos os demais se calaram?

Certo! Eu sei que abro dúvidas que parecem não responsabilizar diretamente as palavras como estava dizendo antes, mas também aí, a falta delas contribuiu para esse quadro, no mínimo triste, encontrado pela empresa pesquisadora.

Acho que todo mundo conhece (quem não conhecer pode procurar porque “tem-no-google”) aquela piada anosa sobre o presidente de uma empresa que manda uma mensagem para a diretoria pedindo para que seus funcionários tivessem uma hora livre para ver o cometa Halley passar e termina... (Ah! Não vou contar né?!)

Pois bem! Essa piada - apesar de sê-lo - é um excelente exemplo do que pode acontecer em uma empresa, aí levando em consideração os diversos níveis da pirâmide administrativa.

Acredito que qualquer um sabe como pode ser enfadonha a leitura de um auto judicial, não é mesmo? Acontece que, essa área é uma daquelas onde as palavras, literalmente, podem matar – apesar de nosso País não adotar a insidiosa pena de morte -, imagine uma sentença aberta a várias interpretações? Podemos chegar ao cúmulo de vermos um criminoso ser liberado logo após o julgamento em que foi condenado.

Por favor, não vamos nos prender aos deploráveis exemplos que temos nas matérias de jornal, pois esses servem mesmo é para corroborar com o que estou dizendo, afinal a soltura de alguns que bem conhecemos, deu-se graças à possibilidade de interpretação dúbia nesse ou naquele processo específico.
Deixemos os juristas com seus problemas e vamos concluir em nossa área, a de TI, apesar de estar claro que o problema é multidisciplinar.

Mais especificamente: um use case mal formulado, no mínimo pode dar problemas no prazo pré-determinado para o desenvolvimento de um sistema; uma reunião para elaboração de uma lista de pré-requisitos, se não for bem orientada, resulta em um desastroso contratempo mais adiante de um projeto e por aí vão os exemplos, até singelos, que podem ser enumerados.

Mas isso nem se compara a má interpretação de algum e-mail corporativo sobre essa ou aquela situação gerencial. Aí estamos falando de demissões, mesmo. E não creio que ninguém que leu esse pequeno texto tenha alguma vontade de passar por essa desagradável experiência.

Então, por favor, escrevam seus e-mails com o máximo de calma que puderem encontrar, conheçam bem as palavras que usam. Quando receberem e-mails procurem lê-los de forma “desarmada” tentando entender o que querem dizer e nunca se acanhem de perguntar o quê, quem o enviou, quis dizer com essa ou aquela frase; façam copydesk antes de enviá-los; passem o texto a ser enviado pelo Microsoft word, pode não ser lá essas coisas, mas ajuda um bocado; e, acima de tudo isso, leiam, leiam muito, leiam bastante, seus cérebros agradecem, nossa língua pátria e a inteligência nacional também.


Até a próxima!

José Vasconcellos

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Ensinando Quem Deveria Ensinar

Tem "gente" (aspas justíssimas) por aí que "bota filho" no mundo e, depois, vai cuidar da própria vidinha medíocre, seja ela de um pobre empregado ou de um diretor de empresas ou político fajuto.

"Gente" assim é o principal fator de criação de tantos degenerados, sociopatas e coisas do gênero pelas cidades do mundo afora. É claro que a marginalidade tem seu maior "pomar" na miséria que vemos por todos os lados também em qualquer cidade, mas essa miséria seria menor se aqueles que podem fazê-lo, procurassem uma atitude mais nobre.

http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2009/05/090505_jovens_alcool_mc_cq.shtml


É como dizem por aí, se não vai por bem que machuque onde dói mais!


Até a próxima!

segunda-feira, 27 de abril de 2009

HERÓIS

“Quanto a mim, a minha opinião é esta: no mundo inteligível, a idéia do bem é a última a ser apreendida, e com dificuldade, mas não se pode apreendê-la sem concluir que ela é a causa de tudo o que de reto e belo existe em todas as coisas.”
Platão, A República (livro VII)

Aos que encontram algum tempo para perder em frente à TV, vivemos imersos em um universo de heróis, temos heróis de todos os tipos, os que voam os que congelam os que possuem garras, os que são invulneráveis. Todos heróis! Aqueles mais próximos de um ser humano, geralmente possuem alguma habilidade intelectual excepcional ou, então, treinaram seus corpos desde tenra idade quando uma desgraça se abateu sobre a família, ou alguma coisa parecida.

Mas, me deixem dizer-lhes que isso nada mais é do que um avanço tecnológico da parede da "caverna de Platão”¹ que, assim como sua antepassada, também esconde as maravilhas da realidade que está logo ali, do lado de fora daquele buraco escuro e mal iluminado – aliás, esse mito da caverna talvez seja a mais importante lição que podemos ter e passar para nossos descendentes nesses tempos de mídia farta, mas deixemos isso para outra hora.

Nosso mundo, ao contrário das ladainhas dos pessimistas, possui heróis de verdade, heróis que se posicionam nas mais diferentes esferas da sociedade e, dentro dos limites que lhes são impostos, promovem belíssimos atos de bravura e heroísmo sejam eles sociais ou humanitários.

Há pouco tempo presenciamos algumas ações que marejaram os olhos de muitos, ações de vários anjos de Santa Catarina que, mesmo tendo perdido tudo e até a família, lutavam e sacrificavam-se para trazer algum alento aos sobreviventes daquela catástrofe, diga-se de passagem, uma catástrofe anunciada, mas não cabe aqui esse assunto.

Oh! Sim, claro que também presenciamos os vilões naquele mesmo lugar, mas a triste verdade é que onde existem heróis, AINDA existem vilões, e vice-versa, felizmente!

No dia-a-dia de nossas vidas, os heróis passam por nós com a humildade dos santos e a coragem dos justos, deixando atrás de si, atos magnânimos carregados de altruísmo e amor ao próximo, sem que sequer percebamos isso.
São vários os lugares em várias cidades do nosso País e do mundo onde, à noite, aparecem poucos milhares desses heróis que ajudam o próximo sem nada pedir em troca, levando um cobertor, ou uma sopa quente, um chocolate, um café com pão ou uma palavra de alento aos muitos milhões de desabrigados que todas as grandes cidades em todo o planeta escondem em suas vielas mais escuras, às vezes, muitas vezes, à própria luz do dia, ao relento da desatenção dos humanos comuns e do descaso dos políticos comuns demais. Heróis que, em equipe, como fossem uma liga, lutam e afastam, mesmo que momentaneamente, a vilania da miséria de corações desesperançosos mas que, naqueles breves momentos, conseguem sorrir como que vislumbrando um mundo melhor com gente melhor.

Mas não veja somente esse time de semideuses como o que temos de heróis entre nós! Essa “liga” é maior, muito maior do que você e eu conseguimos supor.

O bombeiro(a) que, muitas vezes se arrisca para salvar uma pessoa seja um pai, um velho avô ou uma pequena neta, esse se desfaz da necessidade básica do homem de sobreviver, em prol de terceiros. Esses são heróis sempre, quase sempre.

O professor(a) que se dedica diuturnamente para ter a melhor aula ou, ao menos, uma boa aula para ministrar aos seus alunos que, em muitos fins-de-semana, envolvidos em papéis de provas e livros, deixa de estar com sua família para corrigir provas ou prepará-las a contento de sua educação, esse é um herói, e um herói cujos feitos estão no presente, deixando marcas indeléveis para o futuro, o futuro de toda uma sociedade e algumas vezes - como no fundo bem sabemos -, o futuro de todo o planeta.

A enfermeira(o) que corre para aplicar aquela última dose de um determinado medicamento, acaba salvando a vida de um avô querido, um neto muito amado ou uma mãe cuja família reza pela volta ao lar. Esse também é um herói. Daqueles que salvam vidas!

O policial – Oh! Sim, sim, existem muitos que são assim! – que, tentando evitar um número maior de crianças e jovens desgraçados pelas drogas, arriscam suas vidas, seja policiando locais pouco confiáveis, seja enfrentando a fúria dos vilões que se locupletam com esse câncer social e se entrincheiram nas comunidades carentes por todo o nosso País, agindo como capatazes de “senhores de moral ilibada”, que vivem de mentiras no meio da sociedade que, pouco a pouco, vai-lhes conhecendo a máscara suja. Esses policiais também são heróis! E rezo todos os dias para que seu número aumente como se fossem eles um “multi-homem capaz de se multiplicar em infinitas cópias por todo o território nacional e pelas outras terras, também”. Esse é daqueles que arriscam a própria vida, do tipo mais para humano, mas que sabe seu valor.

E os religiosos? Em número desconhecido – sempre maior do que nós, pobres mortais, podemos imaginar – esses “soldados de Deus” têm para si uma das mais árduas tarefas que a “liga” propõe-se a combater, a de lutar contra o vazio, contra a total desesperança, contra o medo que nos acomete na hora de irmos para algum lugar, “aquele” lugar, qualquer lugar que seja esse. Esses heróis, não medem esforços, não se dobram frente à galhofa, não fraquejam em seu intento, pois sabem que são um grupo especial dentro dessa enorme “liga” que, talvez agora, você consiga vislumbrar. Esses também são heróis, daqueles que salvam, talvez, mais do que simples vidas, talvez, quem sabe, talvez salvem existências.

Existem muitos outros heróis, muitos outros. Heróis de um tipo mais que especial, daquele tipo de pessoas que fazem seus trabalhos com dedicação, esmero e afinco, pessoas que, sem nada mais receber senão o salário acordado, sem mesmo pedir algo a mais em troca, dedicam-se às suas atividades com a viva vontade de fazer melhor, com o desejo de, no final do dia ou de um trabalho ou de um projeto, poderem olhar-se com inconfundível e merecida vaidade - aquela de saber ter feito o seu melhor de verdade... Não se iluda essas pessoas, semideuses, não são tão raras assim, elas estão ao nosso redor, geralmente, sem que saibamos disso.

Mas, como disse antes e como não poderia deixar de ser, entre nós, tanto quanto existem heróis, existem vilões e, como toda história de aventuras que se preza, o número desses é sempre maior e nos faz, infantilmente, acreditar que podem dominar o mundo - mas esse nosso mundo tem heróis e precisa de mais heróis.


Então? Está esperando o que?



Até a próxima!

José Vasconcellos

¹ - http://pt.wikipedia.org/wiki/Mito_da_caverna

PS.: Obrigado pela inspiração, Ash Ketchum!




segunda-feira, 6 de abril de 2009

O NEGÓCIO É MALHAR


Muito bem então, vamos lá, me diga você aí: Quem é que presta nesse País?

Sim! Por que se formos nas águas que fluem caudalosamente nos rios de fofocas e "disse-me-disse" da imprensa nacional - olha, eu estou sendo específico, sim: "imprensa nacional" -, se formos por aí não sobra ninguém, não sobra ninguém mesmo, até a menina que morreu por causa de um crachá é condenável (falo pelo que já li por aí), ela não tinha nada que pedir nada, afinal, como manda o regulamento das polícias por aí e por lá no Rio de Janeiro, não devemos e nem podemos esboçar qualquer ação reativa, no caso de uma assalto, certo? É!... Deve estar certo, mesmo, sei lá, afinal não existe - em nenhum lugar do País - um verdadeiro policiamento ostensivo, então deve ser por aí mesmo!

Mas vamos voltar à pergunta: alguém presta nesse País?

A imprensa de um estado tem sérias restrições ao povo de outro estado quando estampam matérias de violência e/ou futebol, se os governos forem de partidos opostos então nem se fala, é mais fácil dar cores fortes e "picantes" à violência em outro local e minorar as matérias sobre os crimes em seu próprio quintal. Aliás, essa mesma imprensa é, visivelmente, fragmentada em tantos pedaços quanto existem facções políticas no cenário da legislação pública brasileira e, cada uma a sua vez, ou em sua mídia preferida, "caem de pancada" em cima deste ou daquele político conforme as necessidades de seus empregadores ou motivos tão espúrios quanto.

ATENÇÃO! É claro que temos profissionais exemplares na imprensa brasileira,
isso é obviamente indiscutível, mas, como em toda profissão, existem exceções.

Mas acontece que eu não estou aqui para atacar a imprensa brasileira, nem os políticos brasileiros ou alguma atividade específica seja ela qual for mesmo porque a idéia é, justamente, questionar o porquê o brasileiro, como povo, consegue tornar qualquer um que se projete como ícone seja ele político, administrativo, cultural ou, até mesmo, artístico - porque, sim, aqui são duas coisas diferentes, sim.


Você teria essa resposta? Ou melhor, você também “malha” o deputado - seja lá de que partido ele for; o atleta - tenha ele conseguido uma medalha ou não; o seu gerente - quer ele tenha ou não seus motivos técnicos para agir da maneira como age; o seu colega de trabalho - porque ele não se barbeou hoje; ou aquele artista que tem a maior pinta de ser homossexual? E por que criar problemas com alguém devido a sua opção sexual?

Você está me entendendo? Eu estou querendo compreender por que nós brasileiros estamos SEMPRE dispostos a criticar o próximo, principalmente quando "o próximo" é brasileiro - porque, realmente, nós SEMPRE estamos prontos para isso, e estamos mesmo!

O que você acha?


Será cultural?... Mas que diacho de "cultura" é essa que se locupleta com o decréscimo alheio?

Será social?... Mas então, estamos mal parados como Nação, não é mesmo?


Será histórico?... Mas encontramos isso distintamente em nossa História? Desde sempre somos assim?


O "histórico" bem poderia lastrear tanto o "cultural" quanto o "social".


Seria um lenitivo pensarmos que somos "produto de gerações"? Que somos o que somos por uma histórica imposição do meio?


Mas estamos falando de fofoca, de denegrir a imagem de quem nunca conhecemos pessoalmente e até de quem conhecemos pessoalmente, de falar mal por hábito... Dá para acreditar? Por hábito!

Eu, sinceramente acredito de coração que essa nossa posição (porque TODOS nós fazemos isso uma hora ou outra), tende a diminuir nossa Nação bem como ajuda um bocado a tornar um hábito as mazelas que "criticamos", mesmo sem sabê-las verdadeiras nesse ou naquele indivíduo, e criticamos, quase sempre, sem olhar para nós mesmos.

Quer saber? No final, esse artigo está mais para um pedido de introspecção da sua parte - e sempre da minha também, é claro: Se deixarmos que essa postura - tão comum entre nós - se perpetue, então de que adianta esperar ou torcer por um país melhor?



Até a próxima!

sexta-feira, 20 de março de 2009

ATENÇÃO: Seu currículo foi procurado

Estou aqui, sentado diante do computador, ouvindo a "Verde-Oliva FM" (acredite, é uma rádio absolutamente excelente), nas passagens de notícias o assunto, é claro, é um só: "ela", não, não é a Gisele, é "ela", a crise, essa coisa amorfa, adimensional, amoral e outros tantos "as..." ou "ins...", que você possa pensar de nulidade, hipocrisia e oportunismo nefasto, e fico pensando cá com meus botões:
Imagine só a cena: Você é um "Profissional-De-TI-Desalocado" (lembram dele? Da fábula?!), que Deus o livre disso, é claro! É apenas uma suposição - ou uma divagação doidivanas, se alguns preferirem - mas você está buscando alguma opção válida de realocação, ao menos ainda pode se dar ao luxo de procurar alguma "opção válida" porque quando chegar aquele momento em que você pede “qualquer coisa” para um amigo, aí meu caro, sugiro um bate-papo muito sério e introspectivo com o Criador.

Você, o “Profissional-De-TI-Desalocado", faz o de sempre, pesquisa sites de empregos, sites de empresas, sites de realocações, sites de "head-hunters", sites de blogs de TI, sites pornôs (ninguém é de ferro, você tem que relaxar... Às vezes!) e o escambáu (adoro essa palavra: es-cam-báu. Tem um ditongo aí! Acho que é decrescente!), mas, enfim, lá está você, caçando e, é claro, com toda aquela ansiedade bastante comum de quem busca desesperadamente o que, simplesmente, parece andar em falta no mercado, ou fugindo de você.

Então está muito bem! Visualizou a situação, certo? Já está introjetado na personagem - É claro! É só uma personagem, nada mais!

Você acessa seu e-mail – como todo santo dia – para verificar se existe alguma novidade, se alguém lembrou de você, se um amigo arrumou alguma coisa, se “pintou” alguma resposta às dezenas de cadastramentos de currículos que você fez por toda a internet.

E lá está!

Reluzindo entre o spam religioso de algum amigo que, mesmo que não pareça, quer o seu bem e o aviso de algum grupo de relacionamento sobre uma mensagem de conteúdo vazio e que pouco lhe interessaria em qualquer momento de sua vida. Lá está ele! Esperando por você - o único “subject” válido para esse momento crítico de sua vida - a única coisa que você realmente espera ver no meio daquelas dezenas de e-mails diários que chegam até você vindos dos recônditos mais profundos do ciberespaço:

“Atenção: seu currículo foi procurado!”

Seus dedos tremem, sua respiração fica ofegante e profunda, você o “Profissional-De-TI-Desalocado”, foi encontrado no meio daquele oceano infinito de bits e bytes, pinçado de seu ostracismo para a libertação prazerosa de uma provável carteira assinada, um salário lhe aguarda por trás daquele “subject”!

Os outros cento e vinte e três e-mails diários não significam absolutamente nada aqueles e-mails do seu amigo sacana que só envia baixaria não interessa mais, nem o e-mail da mamãe, muito menos o daquela gatinha que anda “dando mole” faz um tempão - afinal ela já está dentro -, e com você empregado então, aí é que nem se fala.


Você clica na linha que se destaca de todas com aquele brilho fascinante e...


...um texto com uma enorme propaganda de site de currículos se abre bem na sua frente, dizendo que você precisa dar mais atenção às suas perspectivas de emprego, que a concorrência está apertada e, por isso mesmo, é fundamental que você conheça o novo pacote de soluções para sua empregabilidade atingir níveis estratosféricos.




E aí? Deu raiva, deu?


Até a próxima!